Começando sua carreira cedo, em uma das típicas séries adolescentes da Disney Channel, Shia LaBeou trilhou seu caminho de sucesso, passando por franquias como – Transformers, Wall Street: Poder e Cobiça, Os Infratores e Ninfomaníaca. Não foi à toa que o ator já foi uma das estrelas mais bem pagas e famosas de Hollywood. Entretanto, por trás de toda a fama, crescia um jovem com traumas familiares, que era consumido pela indústria Hollywoodiana. E assim, Shia LaBeouf conta sua história de forma deslumbrante, que com seus monólogos e direção de Alma Har’el, constroem um filme sensível, catártico e intimista.
Honey Boy vai acompanhar a vida do astro mirim Otis (Noah Jupe), uma criança de 12 anos em ascensão na TV, que precisa lidar com os problemas da fama na infância e seu pai James (Shia LaBeouf), um ex-condenado, viciado e verbal e fisicamente abusivo. Após passar por um acidente, Otis (Lucas Hedges), já adulto, resolve se internar em uma clínica de reabilitação para tratar de seus vícios e traumas desenvolvidos em sua infância.
LaBeouf decide mostrar de forma dura e importante, a terrível sensação de abandono que nenhuma criança jamais deveria sofrer. O roteirista pega o público pela mão e transmite todo o seu sofrimento vivido em uma sessão de terapia, agradável de se assistir. Assim, o filme não só trata da influência que um pai ou mãe possuem em uma criança, como também, a imersão de atores mirins na vida da fama.
O brilhante roteiro de LaBeouf, escrito pelo próprio ator durante sua reabilitação, é construído com qualidade e com um caráter íntimo, que junto as atuações criam uma conexão irreparável com seu público. Honey Boy marca a estreia do ator como roteirista em um longa-metragem, e sob as lentes de Har’el, compõe monólogos melodramáticos e sensitivos, destaco aqui as cenas em que Lucas Hedges, como Otis na fase adulta, conversa com sua terapeuta. Aqui, a intenção do ator não é vilanizar a figura de seu pai, que também teve uma infância complicada e abusiva, mais sim mostrar os traumas que isso causou, tal conclusão foi mostrada em cenas em que Otis consegue conviver amorosamente com seu pai, mesmo que em poucos minutos.
A direção de Har’el, que em seus últimos trabalhos foi responsável por clipes de bandas de rock, não extrapola muito tecnicamente, formando uma união sublime com o roteiro pessoal de LaBeouf. A estética da diretoria é um maravilhoso pano de fundo para os diálogos, que são o destaque do filme. Honey Boy se encaixa perfeitamente em sua categoria de filmes independentes, com Alma fazendo uso de planos-sequências minimalistas, cenas com close-ups, ordenados quase para esperar o ator desenvolver a trama. Somada ao roteiro sensitivo de LaBeouf e a direção despretensiosa de Har’el, a trilha sonora Folk de Alex Somers, é um deleito de se escutar ao ver os desenvolvimentos dos personagens.
O filme não só é baseado e escrito por Shia LaBeouf, mas interpretado pelo mesmo. O ator dá vida ao seu pai, um ex-palhaço de rodeio com histórico de vício em drogas e abuso sexual, tomando o filme para si. Mas o grande destaque aqui é Noah Jupe, que vive o pequeno Otis. Noah interpreta comovidamente uma criança infeliz, que está em busca do amor de seu pai, responsabilizando o mesmo como seu tutor. Já Lucas Hedges, o rei dos filmes independentes, também não deixa seu talento de lado, mostrando seu potencial para interpretar jovens problemáticos, como fez em O Retorno de Ben (2019).
A “autocinebiografia”, de Shia LaBeouf toma controle do emocional de quem senta na cadeira do cinema, desde os seus primeiros segundos até seu ato final. O ator deixa claro sua honestidade e sua metalinguagem criando uma catarse intima de quem sofreu uma infância e adolescência de abusos emocionais, psicológicos, físicos, além de alienação parental. Perfeitamente em sintonia, a direção, o roteiro e as atuações, constituem um grande presente de LaBeouf a seu público.
*Filme assistindo durante a cobertura do 21º Festival do Rio 2019