Durante a Ditadura Militar de 1964, no Brasil, o governo instaurado fazia uso da censura para reprimir aqueles que não tinham o mesmo pensamento do governo ou que fazia piadas com o mesmo. O documentário Ta Rindo Do Quê? faz um recorte sobre o humor na ditadura, mostrando que mesmo com toda a brutalidade, truculência e obscurantismo inerentes ao regime da época, os humoristas usavam o humor como válvula de escape para a população, criando formas de driblar patrulhas e censuras, além de revolucionar a linguagem. No filme podemos ver que muitas das vezes o humor serviu como resistência, porém, alguns humoristas pagaram um alto preço por produzirem certos conteúdos.
Com a direção do trio Claudio Manoel, Álvaro Campos e Alê Braga, o documentário intercala as entrevistas com diversos humoristas, que contam suas histórias durante o regime militar, com algumas animações de cartuns e, com imagens e vídeos da época. No início do filme, com uma arte que antecipa a temida caneta vermelha, são exibidas imagens em preto e branco, mostrando a ambiguidade e a ebulição do povo entre os idealismos de direta e esquerda, imergindo o telespectador na triste época.
Juca Chaves, Daniel Filho, Ary Toledo, Boni, Chico Caruso, Eliezer Motta, Bemvindo Sequeira, Agildo Ribeiro, Jaguar, Carmen Siqueira, Fafy Siqueira, Carlos Alberto de Nóbrega e Roberto Guilherme são alguns dos entrevistados. Um dos destaques entre os entrevistados é o Carlos Alberto, que não vê nenhum lado positivo na Ditadura, afirmando que a falta de liberdade é assassina. Refletindo a inquietação que os humoristas ficavam na época, muitos entrevistados contam seus relatos de terem o texto censurado, deixando o telespectador alienado a todos os acontecimentos da época. Uma das grandes características do Regime Militar foi a intervenção violenta aos artistas, na época, de maioria comunistas, os humoristas sofriam perseguições, prisões, entres outras violências, porém sempre ressurgiam com novas piadas e ganância pela liberdade.
Outro pensamento da época também é mostrado no documentário pelo Roberto Guilherme, chamado de Sargento Pincel, ele defende que naquele período havia respeito e as pessoas podiam andar na rua com ouro que não seriam roubadas. Tal pensamento, individualista, mostra como a alienação era presenta na sociedade, fazendo as pessoas se importarem apenas com o bem estar pessoal, já o cotidiano dos outros não importava.
Os diretores não apenas usam imagens para reconstruir a época durante a sessão, os vídeos usados são de veículos, programas de TV e propagandas, como por exemplo, a precursora revista “Pif-paf“, criada por Millôr Fernandes, passando pelo “Pasquim”, que se consagraram com a irreverência crítica com que trataram a política, e vai até o grupo teatral cômico e anárquico “Asdrúbal Trouxe o Trombone”. Programas de TV como o primeiro seriado brasileiro de sucesso “Família Trapo”, e os humorísticos de Chico Anysio, Jô Soares, Trapalhões também se destacam.
O documentário aborda muitos assuntos, dois deles são o papel feminino no humorismo e a pornochanchada. Fafy Siqueira, Carmem Verônica, Alcione Mazzeo e Regina Case discutem como a mulher eram estereotipadas durante os anos de chumbo. Para Fafy Siqueira as mulheres eram classificadas em: a gostosa ou a feia engraçada. Fafy também comenta sobre a importância da Dercy Gonçalves, que foi inspiração para o fim dos estereótipos sexuais. A pornochanchada também teve um grande peso entre 1975 e 1979, momento auge do movimento cinematográfico, que mostrava muito mais a realidade da ditadura do que o erotismo.
E então o documentário caminha para seus últimos momentos, mostrando que muitos sofreram um bloqueia criativo, devido a censura. Henfil (em entrevistas antigas), Caruso e Daniel Filho argumentam sobre a fiscalização e a revisão de seus trabalhos, alguns acham que isso ajudava na criação, já Henfil falava que a censura não tinha nenhum lado positivo. Ta Rindo Do Quê? Fala sobre um assunto importante para a história do Brasil e do mundo, fazendo um bom recorte de temas e de acervos da época. Para quem não está acostumado com documentários e linguagens da época, o documentário pode ser um pouco cansativo, mas para aqueles que amam história e um bom documentário, os 85 minutos de duração passam voando.