sexta-feira, abril 26, 2024
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Crítica | Os Miseráveis (2020)

O cinema francês sempre foi construído e conhecido por seu poder de contar histórias de forma crua, real e intensa. Em Os Miseráveis, o corroteirista e diretor Ladj Ly, não foge de sua origem, retratando uma complexa realidade social em um distrito de Paris, entrelaçando métodos documentais e ficcionais, de forma tensa e carregada de reviravoltas. Dividindo o prêmio do júri em Cannes em 2019 com Bacurau, Os Miseráveis pega emprestado o título da obra imortal de Victor Hugo, infiltrando a complexa luta de classes, entre as etnias da França, composta por negros, mestiços, árabes e brancos, que se combinam em um registro autêntico de protestos que marcaram algumas cidades francesas em 2005.

Ladj Ly nos transporta para o árduo território de Montfermeil, no leste de Paris, acompanhando a rotina dos policiais Chris (Alexis Manenti) e Gwada (Djibril Zonga), que trabalham como uma patrulha responsável por fazer rondas pela cidade e manter a ordem, usando o mínimo de acessórios policiais, para assim se infiltrarem melhor na comunidade. Quando o policial Stéphane (Damien Bonnard) é transferido para a mesma unidade da dupla, eles irão precisar lidar com a personalidade forte do novo recruta.

Em um dia normal de patrulha, o trio precisa controlar uma briga entre gangues, e descobrem que um filhote de leão do circo foi roubado. Com isso, eles começam um policiamento pesado para encontrar o culpado do roubo, e quando acham o responsável se deparam com o jovem rebelde Issa (Issa Perica), e a tentativa de prender o jovem acaba saindo pela culatra. Um dos policiais acaba cometendo um erro, que foi filmando por um drone, controlado por um garoto local, e o trio preciso correr contra o tempo para o vídeo não cair em mãos perigosas.

Os Miseráveis tem uma trama coberto por clímax e drama, conseguindo abordar diversos temas importantes, como a brutalidade policial, a divisão entre as classes sociais, e a superioridade de facções de forma totalmente descritiva e verídica. Aliás, outro detalhe interessante e que colabora para autenticidade do filme, é o complemento de personagens reais no filme, como o chefe que domina a feira da cidade. Além disso, é visível que o diretor sabe como abordas as histórias e as parcelas da sociedade, já que o mesmo é parisiense de família imigrante do Mali, e mora em Montfermeil até hoje.

O longa é composto por uma combinação de atores profissionais e amadores, mostrando a diversidade do território parisiense. O jovem Issa Perica é o destaque entre todos os demais, o ator mirim consegue mostrar o colossal desenvolvimento que seu personagem passa e sofre, desde o momento em que é atingido pelo policial. O trio de policiais consegue ser bem tipificado, tendo o policial “bom” (Djibril Zonga), o policial “mau” (Alexis Manenti) e o recruta (Damien Bonnard), as atuações conseguem segurar as personalidades fortes dos personagens, que são uma retratação fidedigna de pessoas da sociedade atual.

Ladj Ly filma ótima cenas usando uma gravação nervosa, com a câmera na mão em boa parte do filme, para nos imergir na experiência cotidiana, hora a hora, de estar nas ruas. Com alguns takes colados aos corpos dos jovens, o diretor envolve o telespectador na comunidade num registro social semelhante ao documental. Destaque para o terceiro ato do filme, composto apenas em um único cenário, de difícil locomoção, o que deve ter necessitado de muito treinamento da parte técnica e da atuação.

Por fim, Os Miseráveis não deixa de mostrar suas raízes do cinema francês, mas que faz uso das mesmas características para mostrar uma história interessante, complexa e verossímil. Mostrando a heterogeneidade das sociedades parisienses, o diretor cria uma experiência que deixa o público tenso, abordando temas importantes para a sociedade atual.

 

 

Patrick Gonçalves
Carioca, estudante de comunicação, apaixonado por séries e filmes, coleciono DVD's e ingressos de cinema.

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